19/02/2007

Milhares e milhares de trabalhadores por conta de outrem, obrigados a recorrer aos falsos recibos verdes para poderem trabalhar.







Milhares e milhares de trabalhadores por conta de outrem, obrigados a recorrer aos falsos recibos verdes para poderem trabalhar.

Jerónimo de Sousa interveio, no Porto, sobre a precaridade e o trabalho ilegal aos quais considerou «necessário dar combate prioritário, no plano da luta e da iniciativa política, para fazer retroceder e anular esta crescente tendência para a precariedade das relações de trabalho na sociedade portuguesa.

São hoje mais de 828 mil trabalhadores com contratos a termo e com uma das mais altas taxas da União Europeia, apenas superada pela Polónia e pela Espanha.

Precariedade que atinge também muitas outras dezenas de milhares de trabalhadores, vitimas das empresas de trabalho temporário e aluguer de mão-de-obra, cujas actividades se vão expandindo sem controlo e sem lei. Milhares e milhares de trabalhadores por conta de outrem, obrigados a recorrer aos falsos recibos verdes para poderem trabalhar.

A estes trabalhadores, juntam-se também 570 mil trabalhadores em situação de trabalho parcial, não porque o desejem, mas porque não têm outra alternativa.

O trabalho precário significa esse permanente saltar de um lado para outro sem estimulo à formação e à qualificação, sem condições e possibilidades de verdadeiras qualificações.

Na verdade a precariedade dos contratos e dos vínculos, é a precariedade da família, é a precariedade da vida, mas é igualmente a precariedade da formação, da experiência profissional e da produtividade do trabalho, comprometendo o desenvolvimento do país.

No boletim mensal do mês passado do Banco de Portugal, pudemos verificar que mais de 7% do emprego declarado, cerca de 364 mil pessoas apenas conseguiam garantir 20 horas de trabalho semanal. E dentro destes, cerca de 110 mil trabalhadores só conseguiam um salário correspondente a dez horas.

Toda esta realidade da precariedade laboral está também associada ao grave problema do trabalho não declarado e ilegal que é hoje ainda uma situação difícil de avaliar na sua verdadeira dimensão, mas que se deduz pelo enorme peso que apresenta em Portugal a economia subterrânea que pelos vários estudos que se vão fazendo se estima se situe entre 20 a 25% do Produto Interno Bruto. Realidade que é sem dúvida um forte incentivo à precariedade, mas também ao tráfego de mão-de-obra envolvendo o trabalho imigrante, além de ser uma forma de debilitar o financiamento da segurança social e das receitas do Estado.

Mas a precariedade não é apenas uma preocupante situação que se constata no sector privado. Ela é uma realidade de um país em que o Estado, em vez de dar o exemplo, faz exactamente o contrário. Na verdade, os sucessivos governos não têm hesitado em usar e abusar das diferentes formas de contratação precária, nomeadamente com o recurso à abundante prática dos recibos verdes e de outras situações precárias que envolvem cerca de 150 mil trabalhadores. Milhares de trabalhadores que desempenhando funções permanentes sem qualquer vínculo e sobre os quais pesa de forma permanente a ameaça da suspensão, depois de anos de trabalho, com a particular injustiça de ficar sem emprego e sem qualquer tipo de indemnização.
in

http://www.pcp.pt/index.php?option=com_content&task=view&id=23738&Itemid=245

A municipalização de solo urbano, feita por si, foi de tal dimensão e importância que ainda hoje se sentem os seus efeitos.


Evocar

Duarte Pacheco




A propósito de um texto do Pedro Ornelas no Céu sobre Lisboa acerca da resistência e reaccionarismo que sempre existitu nos lisboetas às mudanças da sua cidade, vem a calhar o livro que comprei ontem na Livraria Municipal alusivo aos 50 anos da morte do Duarte Pacheco.

In

http://viveraltadelisboa.blogspot.com/2006/03/evocar-duarte-pacheco_30.html

Assumo a ignorância. Nunca me tinha apercebido da importância, visão e ousadia do homem. Fez mais coisas bem feitas nos quase seis anos que esteve à frente da CML do que muitos dos que se lhe seguiram fariam mesmo que vivessem 500 anos. Deus distribui muito mal a inteligência e talento, e Lisboa tem pago caro por não ter sabido escolher os seu líderes.

O livro é fraquinho, como aliás é assumido logo no início desconcertantemente: "O tempo, extremamente curto, com que nos deparamos para levar a cabo este projecto, não nos permitiu aprofundar devidamente a investigação nem preparar um catálogo bibliográfico existente no GEO (Gabinete de Estudos Olissipenses) sobre Duarte Pacheco." Assim, tal e qual, para a posteridade. É fraquinho, o livro, porque não desenvolve. Resume-se a uma série de fotografias dos vários projectos iniciados por Duarte Pacheco o que mesmo assim vale a pena por nos dar essa ideia de grande capacidade de iniciativa e decisão acertada.

O prefácio do João Soares, ex presidente da CML, na altura ainda Vereador da Cultura, é uma boa síntese evocativa que por valer a pena ler transcrevo aqui:

Duarte Pacheco marcou, de forma decisiva, não apenas a imagem da Lisboa do seu tempo mas também a do País. A sua personalidade e o seu espírito empreendedor foram marcados por uma vontade de modernidade, em contradição com as circunstâncias da época em que viveu. Por estranho que pareça se essas mesmas circunstâncias não o deixam florescer em plenitude, também fizeram com que a sua acção, ainda hoje, se sinta nesta cidade de Lisboa.

Foi Ministro das Obras Públicas e Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, chegando a acumular os dois cargos. Foi professor e director do Instituto Superior Técnico, devendo-se à sua acção o grande salto qualitativo da engenharia portuguesa que, felizmente, tem continuado nessa linha de qualidade, inovação e modernidade.

A cidade deve-lhe não apenas o Parque de Monsanto ou o Aeroporto mas uma ideia de cidade cuja expansão, urbanização e arquitectura, entregue a arquitectos prestigiados, assentava numa activa participação do município na definição das regras urbanísticas e no controlo do uso do solo.

A municipalização de solo urbano, feita por si, foi de tal dimensão e importância que ainda hoje se sentem os seus efeitos. Basta comparar o que foi feito, em termos urbanísticos, nos Olivais, já depois da sua morte, pela Câmara Municipal de Lisboa e aquilo que foi, mais tarde a urbanização de iniciativa privada e sem controlo municipal, em Benfica.

Dois exemplos que mostram bem a actualidade dos seus critérios para a organização da expansão urbana, com um claro entendimento de que sem uma efectiva municipalização do solo urbano, é difícil a criação de espaços qualificados onde viver seja algo mais do que morar.

Duarte Pacheco soube reunir à sua volta um núcleo qualificado de grandes artistas, arquitectos e engenheiros que deram forma às muitas iniciativas a que se foi dedicando.

E se a engenharia civil lhe deve muito - o viaduto que tem o seu nome é bem o exemplo da importância de um bom ponto de partida para o grande domínio da engenharia de pontes - a arquitectura teve nele um patrono que permitiu que, na diversidade dos estilos, se exprimissem os grandes arquitectos do seu tempo e que são referências essenciais da arquitectura portuguesa, de Cassiano a Pardal Monteiro e a Keil do Amaral, e deve--lhe o urbanismo uma cidade moderna, voltada ao futuro, de que nem sempre os seus sucessores cuidaram como deviam.

Bastava o Parque de Monsanto para que Duarte Pacheco fosse uma referência obrigatória para quem tem por missão cuidar da cidade com dedicação, amor e disponibilidade permanente. O que resta da sua acção é mais do que isso: é o exemplo de como a modernidade é sempre factor de progresso e de como a qualidade não é incompatível com o viver na cidade.

A Lisboa de hoje é disso exemplo, nas boas e más venturas do urbanismo que tem suportado as suas transformações, crescimento e expansão.

[...]


João Soares
Vereador do Pelouro da Cultura da CML

Mas o que também impressiona no livro é constatar como está diferente e mais gorda a Lisboa dos nossos dias. E é questionável se é para melhor. Sem querer ser reaccionário ou saudosista também, guardo as melhores recordações de Lisboa no tempo da minha infância, ainda nem há três décadas, quando havia um décimo dos automóveis de agora. Realmente, para além dos assassinatos estéticos do Krus Abecassis nas Avenidas Novas e da degradação do edificado e do êxodo da população para a periferia da cidade, a grande transformação, a mais radical, foi a cedência do espaço aos automóveis. Várias decisões erradas que transformaram ruas em autoestradas, roubando aos lisboetas a qualidade de vida que existia. O aumento do parque automóvel reflete o aumento do poder económico, consequência natural e positiva do degelo salazarista, mas a população não soube conter a voracidade da posse e acabou por matar Lisboa. Agora não há rua desocupada, não há vista sem carros, não há artéria principal sem problemas de poluição excessiva.

Será preciso alguém com coragem e inteligência para tomar as difíceis medidas necessárias para que recuperemos a cidade. Duarte Pacheco moreu prematuramente aos 43 anos num trágico acidente de automóvel. Também nestas coisas Deus escolhe mal as suas vítimas.

publicado por Tiago Figueiredo

in http://viveraltadelisboa.blogspot.com/